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“Os museus fazem parte, de modo claro, da casa de sonhos da coletividade”.
Walter Benjamin
Em 2020, visando o objetivo específico do Programa de Gestão de Acervos de “articular ações, para constituir e/ou fortalecer o Centro de Pesquisa e Referência do museu, ampliando as possibilidades de produção e difusão de conhecimento ao público sobre as temáticas do acervo” (MUSEU CASA DE PORTINARI, 2021, p. 35), o Museu Casa de Portinari recebeu, em comodato, uma série de jornais, panfletos, anotações particulares e correspondências do Sr. Lauro João Almeida Pinto, amigo de infância do artista e editor do jornal “A Cidade”, de Brodowski (SP), por várias décadas. A coleção, cedida por familiares do Sr. Almeida, é uma ferramenta valiosa de pesquisa, que permite uma ampliação da compreensão da trajetória de Candido Portinari e suas relações com a cidade natal e seus conterrâneos durante o século XX.
Para a instituição museal, a Coleção Almeida potencializa e diversifica as possibilidades de diálogo da narrativa institucional, aportada pela missão do museu, que compreende a preservação, pesquisa e comunicação da casa onde viveu Candido Portinari e de seu acervo, enquanto testemunhos da história local, regional e nacional.
Além de relatos do dia a dia da Brodowski antiga e seus munícipes, ilustres ou não, “A Cidade” traz uma perspectiva mais intimista e cotidiana sobre a vida de Candido Portinari no município e sua produção plástica. Ademais, aponta acontecimentos históricos gerais, contextualizando a realidade social que nortearam e influenciaram as escolhas e realizações do artista.
Os jornais são objetos que estiveram muito presentes na vida urbana nos últimos três séculos, mas foi a partir da década de 1980 que os historiadores começaram a empregá-los como fontes históricas, capazes de oferecer inúmeras informações, discursos e indícios para a análise das sociedades que os produziram e dos meios nos quais eles circularam.
Empregados em espaços de informação e cultura como museus, arquivos, bibliotecas e centros de pesquisa e referência, os jornais permitem uma investigação pormenorizada de aspectos geográficos, econômicos e socioculturais referentes a um período, lugar ou personalidade.
Esta recuperação de dados históricos contextualizados, em museus, contribui para a geração e difusão de conhecimento ao incorporarem processos de pesquisa e documentação, em uma ação sistematizada que, por meio de um conjunto de pressupostos teóricos e procedimentos técnicos, visa identificação, organização e contextualização das informações relativas aos objetos museológicos de acordo com suas especificidades (MONTEIRO, 2010, p. 30).
A análise dos fatos históricos, do cotidiano de uma pequena cidade no interior e as ações de um sujeito parecem estar a princípio distantes, mas a memória individual não se constrói sem o coletivo, e as influências entre os indivíduos atravessam as barreiras culturais, em uma confluência de sentidos e expressões entre várias partes do mundo que são responsáveis por movimentar cadeias abrangentes de comunicação e interação.
Desta forma, abranger o contexto histórico e cotidiano é não só uma ferramenta para compreender as pulsões do pintor e suas ações, como também um meio para entender a cultura do país e do mundo, analisando suas relações de poder que geraram a realidade social em que viveu o artista. De mesmo modo, nos jornais, essa característica compõe um rico material para reflexão sobre as práticas de trabalho, modos de morar e falar, lazer e religiosidade de determinado período.
Como um dos primeiros produtos do trabalho de análise e estudo da Coleção Almeida, a equipe técnica desenvolveu a pesquisa “Portinari n’A Cidade”, material que levantou todas as menções a Candido Portinari e seus familiares identificados na referida coleção, relacionando com os momentos históricos da vida e obra do pintor, bem como o contexto social, econômico e histórico da época (MUSEU CASA DE PORTINARI, 2022).
Dentre outros fatos, a pesquisa apresenta registros variados de visitantes recebidos por Portinari em Brodowski, momentos em que chegou ao município com encomendas de obras para executar, e as agens para descansar, mapeando sua rotina de trabalho.
Nesse sentido, a pesquisa da coleção e a possibilidade de tratamento técnico da mesma representa uma oportunidade de fortalecimento do papel institucional para com o público do museu, disponibilizando informações inéditas para pesquisadores, estudiosos e interessados em geral na história da terra natal de Candido Portinari.
Por fim, a Coleção Almeida oferece um vislumbre detalhado da relação entre o artista e sua cidade natal, Brodowski, revelando aspectos íntimos e cotidianos que enriquecem a narrativa histórica. A análise desses materiais não só ilumina o contexto social e histórico que moldou Portinari, mas também destaca a importância do Museu Casa de Portinari na preservação e comunicação dessa rica herança cultural valorizando a memória coletiva e a influência duradoura do artista na cultura brasileira.
Referências
MUSEU CASA DE PORTINARI. Programa de Gestão de Acervos. In: Contrato de Gestão nº 04/2021. ACAM Portinari: Brodowski, 2021. Disponível em: <https://www.acamportinari.org/wp-content/s/1.-Contrato-de-Gestao_04_2021_e_Anexos_I_a_V.pdf> o em: 20 set. 2024.
MUSEU CASA DE PORTINARI. Estudos introdutórios: Portinari, “nA Cidade”. Núcleo de Acervo do Museu Casa de Portinari. 2022. 44p.
MONTEIRO, Juliana. Diretrizes Teórico-metodológicas do Projeto. In: Documentação e Conservação de Acervos Museológicos: Diretrizes. Governo do Estado de São Paulo. ACAM Portinari. São Paulo: Brodowski. Junho de 2010. P.31-45.
Referências Complementares:
BARROS, José D’Assunção. Sobre o uso dos jornais como fontes históricas – uma síntese metodológica. Revista Portuguesa de História – t. LII (2021) – p. 421-443– ISSN: 0870.4147.
BENJAMIN, Walter. agens. Organização da edição brasileira: Willi Bolle, colaboração na edição brasileira Olgária Matos. Belo Horizonte: Editora UFMG. 2006.
FABBRI, Angélica. A Casa de Portinari. Brodowski, SP: ACAM Portinari. 2021. Disponível em: /wp-content/s/2022/03/a-casa-de-portinari-web.pdf.
LE GOFF, J. História e memória. Campinas: Ed. Unicamp, 1990. Disponível em: https://www.ufrb.edu.br/ppgcom/images/Hist%C3%B3ria-e-Mem%C3%B3ria.pdf. o em: 10 de set. de 2021
MENESES, Ulpiano Bezerra. O Museu de cidade e a consciência da cidade. In: Atas do Seminário Internacional Museu e Cidade. Rio de Janeiro: Museu Histórico Nacional. jan. 2003.
MENESES, Ulpiano Bezerra. O Museu na cidade, a cidade no museu: para uma abordagem histórica dos museus de cidade. Revista Brasileira de História, v. 5, n. 8-9, p. 197-205, set 1984 – abr 1985.
MUSEU CASA DE PORTINARI. Plano Museológico. Brodowski: ACAM Portinari. 2022. Disponível em: https://www.acamportinari.org/wp-content/s/planomuseologico2022M.pdf.
PATRICI, Cristiane Maria. Documentação dos Jornais (Brodowski – SP, 1922-1958) da Coleção Almeida no Museu Casa de Portinari: estudo de indexação. Projeto de Pesquisa. Museu Casa de Portinari: ACAM Portinari. 2024. Disponível em: /projeto-de-pesquisa/.
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